terça-feira, 11 de março de 2008
Migalhas
Não digas nada, dá-me só a mão. Palavra de honra que não é preciso dizer nada, a mão chega. Parece-te estranho que a mão chegue, não é, mas chega. Quantos são hoje?
(...)
Não te apetece apertar-me, não tens vontade de ser terna? Gostava que ma apertasses três vezes, depois eu apertava três vezes, depois tu apertavas quatro vezes, depois eu apertava-te quatro vezes e ficávamos que tempos assim, num morse de namorados. Fantasias. Desejos. Se calhar sou uma pessoa carente. Se calhar nem sequer sou carente, sou só parvo.
(...)
De vez em quando sorria-me
- João
e ficava a repetir
- João
numa cisma contente. Dás-me licença que te beije? Não? Não te vás embora ainda, deixa-te estar. Apesar de tudo passámos um bocado agradável, não foi? A mim agradou-me. Gosto do teu cheiro. Se te apetecer voltar toca a campainha três vezes e carrego naquele botão que abre a porta da rua. E se me avisares com antecedência compro um bolo. Quando não estiveres cá e me sentir sozinho como as migalhas que sobrarem. Vou contar-te um segredo: há alturas em que as migalhas ajudam.
António Lobo Antunes
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3 comentários:
Este homem tem textos divinais, com palavras e assuntos banais.
É fantástico.
Migalhas de bolachas com pepitas de chocolate ...
Concordo m5sol, ele é fantástico mesmo.
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